Cinco volumes dos Sermões do Padre Antônio Vieira, publicados no final do século XVII e início do século XVIII, estão entre as 20 obras raras da Biblioteca do Mosteiro de São Bento que serão restauradas com recursos do Fundo de Cultura do Estado.

O termo de compromisso, assinado, nesta sexta-feira (27), pelo arquiabade Dom Emanuel D’Able e o secretário de Cultura do Estado, Márcio Meirelles, prevê a aplicação de R$295 mil na restauração e preservação do acervo e na melhoria das condições de conservação dos 300 mil volumes da biblioteca e do Centro de Documentação e Pesquisa do Livro Raro do Mosteiro.

O projeto apresentado pelo Mosteiro foi um dos 120 aprovados dentre 420 apresentados ao Fundo de Cultura, no ano passado, e viabiliza também a digitalização e implementação de programas de acesso às obras do acervo.

Tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a biblioteca foi criada em 1582, quando os beneditinos chegaram a Salvador e fundaram o primeiro mosteiro da ordem no Novo Mundo. Dentre os 300 mil volumes do acervo, 13 mil são considerados raros. O mais antigo, perfeitamente preservado, foi escrito em 1503.

Segundo Dom Emanuel, esta é a primeira vez em que o Estado investe em projetos de conservação do acervo do mosteiro. “Para a nossa biblioteca, esta é a primeira parceria, que é importante não só para possibilitar a conservação de obras raras, muitas delas únicas no país ou exemplares que só existem quatro ou cinco no mundo, como também para dar melhor acesso ao público”, disse. O Mosteiro preserva um acervo acumulado em mais de quatro séculos. “Felizmente, nunca tivemos um incêndio, que é o grande inimigo das bibliotecas”, enfatizou.

Manuscritos

No acervo estão preservados manuscritos e impressos como bulas papais, impressos em pergaminho de pele de cordeiro, documentos relativos à vida privada do Mosteiro, a coleção dos livros do Tombo, com testamentos de Catarina Paraguaçu e Garcia D´Ávila, cartas de alforria e documentos de compra e venda de escravos, documentação relativa às propriedades de toda a Região Metropolitana de Salvador.

Há também manuscritos que guardam informações e registros de momentos históricos, como a caderneta de um monge com anotações e depoimentos de feridos e mutilados da Guerra de Canudos, acolhidos na instituição durante o conflito.

Doação

“Este é um acervo que conta também parte da história da Bahia, sendo um dos mais importantes da América Latina. Ao apoiar este projeto, o Fundo de Cultura cumpre plenamente com a sua atribuição de preservar a nossa memória e também contribuir para que estas obras estejam disponíveis para nossos estudantes e pesquisadores”, afirmou Márcio Meirelles.

O projeto viabiliza também a estrutura para acolhimento dos oito mil volumes do acervo particular do intelectual e acadêmico Pedro Moacir Maia, que morreu no ano passado, aos 79 anos. O ex-diretor do Museu de Arte Sacra e membro Academia de Letras da Bahia (ALB) confiou, em vida, ao Mosteiro, a preservação do seu acervo, acumulado durante décadas.

Os livros serão classificados, catalogados, indexados e estarão completamente inseridos no acervo em nove meses. “Como ele era um estudioso e adquiria sempre obras importantes, é impressionante a quantidade de obras valiosas sobre arte cristã, muitas que não estão disponíveis nem em mosteiros”, avaliou Dom Emanuel.

A previsão de restauração dos 20 volumes escolhidos é de aproximadamente dois anos, afirmou a coordenadora de livros raros da Faculdade São Bento, a filóloga e professora Alicia Duhá Lose, responsável pelo projeto. Antes de serem restaurados, os livros serão fotografados página por página Em seguida, explica Alicia, serão desmontados submetidos folha por folha à recuperação das partes perdidas e depois remontados.

Posteriormente, será feita uma versão digital, que estará disponível para estudantes e pesquisadores. “Felizmente, as traças e outros insetos se alimentam do papel, mas evitam a tinta, que contém chumbo e outras substâncias tóxicas e isto impede um estrago maior da obra”, diz.

Pouco mais de 50% do acervo está em línguas estrangeiras, como espanhol, grego e latim, que compõe um mosaico de culturas distintas. Há também revistas, mapas, fotografias, jornais, documentos e manuscritos, além das obras raras editadas entre os séculos XVI ao XVIII. Estão entre as 20 obras que serão restauradas, a Seleção de Questões Disputadas sobre a Metafísica e os Ensinamentos de Aristóteles (1685) e Theatro Crítico de Freijo (1876), dedicado ao “sereníssimo señor Infante de España Dom Carlos de Bourbon e Farnefio”, e a Colleção dos Breves Pontifícios, e Leys Regias, expedidos e publicados desde 1714. Segundo Alicia Duhá, as obras foram escolhidas em função de critérios como quantidade de exemplares disponíveis, autoria, ano de publicação, marcas de propriedade, e anotações posteriores.