Dona Maria Enedina não tem mais a mesma firmeza na mão, nem uma vista muito apurada, mas nada disso impediu que, aos 100 anos de idade, decidisse começar a estudar. Há dois meses, a senhora se matriculou no Programa Todos Pela Alfabetização (Topa), oferecido pelo Governo do Estado e, pela primeira vez, teve a oportunidade de freqüentar a sala de aula.

“Sempre tive vontade de aprender a ler. Isso era meu sonho, não podia morrer sem saber fazer pelo menos meu nome”, afirmou Dona Maria, enquanto explicava que foi o pai quem a proibiu de ir à escola. “Ele dizia que, lá, eu ia acabar arranjando um namorado, e não me deixava ir, só meus irmãos. Cresci assim, sem ir à escola e, por causa disso, passei muita dificuldade nessa vida”.

Na mesma turma de Dona Enedina, o filho dela, Lourival Rodrigues, que tem 61 anos, também está sendo alfabetizado. Lado a lado, os dois enfrentam as dificuldades de começar depois de tanto tempo. “Quando a gente é menino não quer pensar em escola, só quer diversão, pescar, caçar. Quando chega essa idade é que vai saber o que é uma sala de aula e como ela é importante,” disse Lourival.

Para o resto da turma, que tem média de idade de 40 anos, mãe e filho são exemplos de empenho e dedicação. “Quando ela chegou, me surpreendeu, pela força e pelo desejo de aprender mesmo com essa idade”, contou o colega de sala, José Santana.

A professora Eunice Correia afirmou que Dona Enedina é uma das mais assíduas. “Ela vem todo dia e apesar das dificuldades motoras mostra interesse e participa de tudo”.

Dona Enedina, que nasceu em Itabuna e mora em Ilhéus, é tão querida pelos colegas que ganhou até uma festa de aniversário. A comemoração teve direito a bolo decorado e vela dos 100 anos.

Depois dos parabéns, ela abraçou a todos e, emocionada, recitou um verso em agradecimento. “Viva o dia, viva a noite e viva o meu jardim de flor. Viva todos os alunos e o meu professor”.

Um milhão de pessoas alfabetizadas

Em 2006, a Bahia era o estado campeão de analfabetismo. Tinha quatro milhões de pessoas que nunca haviam freqüentado a escola. Em 2009, o estado tem 200 mil pessoas sendo alfabetizadas e outras 171 mil que já aprenderam a ler e escrever. A meta é alfabetizar um milhão de baianos até 2010, por meio do Programa Todos Pela Alfabetização (Topa), da Secretaria da Educação do Estado (SEC).

“Nós fazemos um verdadeiro rescensiamento. Os nossos educadores vão de porta em porta para encontrar quem não foi alfabetizado e convidar a participar das aulas”, disse a coordenadora do Programa para a região de Ilhéus, Lucia Helena Rosa.

Para facilitar o aprendizado, as aulas seguem o modelo construtivista, desenvolvido pelo educador Paulo Freire. A alfabetização popular parte da realidade do aluno e usa a experiência de vida para ensinar e despertar a cidadania. “A aula tem como base, um tema central que desperte o interesse dos alunos – é o chamado tema gerador. A partir desse tema, escolhemos textos simples sobre o assunto para trabalhar a oralidade, a escrita e a leitura,” explicou a coordenadora do Topa na região de Ilhéus, Lúcia Helena Rosa. O curso leva oito meses e deixa o aluno apto a continuar no ensino regular.