No mês em que é comemorado o Dia da Consciência Negra – 20 de novembro -, a Bahia conquistou o segundo lugar no Prêmio Nacional de Educação em Direitos Humanos, promovido por meio da parceria entre a Organização dos Estados Ibero-Americanos, o Ministério da Educação (MEC), a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, e a Fundação FM. O projeto “Cor do Brasil: Uma Prática de Sucesso na Educação Prisional”, desenvolvido na Penitenciária Lemos Brito (PLB), pelo Colégio Professor George Fragoso Modesto, concorreu com dezenas de experiências de todo o Brasil.

Com a temática do negro, atividades e religiões de matrizes africanas, o projeto se tornou fundamental para as diretrizes de ressocialização desenvolvidas pela PLB para o atendimento aos detentos. “Ofertamos educação para os detentos, jovens e adultos, atendemos regimes fechado e semiaberto, com atividades de escolas e especificidades de instituições prisionais. O projeto se encaixou entre os temas apresentados em sala de aula, e isso possibilitou um novo olhar sobre o assunto”, destacou  a diretora do Colégio Professor George Fragoso Modesto, Maria das Graças Barreto.

Embora o colégio funcione em cinco unidades prisionais – quatro no Complexo Penitenciário Lemos Brito e uma na Colônia Lafayete Coutinho –, a escola não é a única ferramenta oferecida pelo sistema carcerário para a inclusão social de detentos na Bahia. Por meio do Programa Começar de Novo, o Governo do Estado, em parceria com o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-A), tem incluído o trabalho na rotina de muitos presos. Pedro Paulo Oliveira, 28 anos, preso em 2004 é um dos que tiveram oportunidade de voltar a trabalhar ainda na cadeia. Ele atua para uma empresa de confecção de trapos para limpeza automotiva, que fica na penitenciária.

“Ocupo meu tempo com o trabalho  e me sinto útil. Além disso, posso mandar todo mês um pouco de dinheiro para minha família, que mora longe. Vou exercitando a mente para quando sair daqui [da penitenciária] seguir uma profissão e esquecer a cadeia”, conta o detento, que passou a usar farda azul dada apenas a presos avaliados com bom comportamento.

Programa Começar de Novo

Ao todo, sete empresas cadastradas no Programa Começar de Novo funcionam na Penitenciária Lemos de Brito. Cada uma  paga, por funcionário, um valor de pelo menos três quartos do salário mínimo. Para o empresário do setor de reciclagem e artefato de plástico, Jailton Gomes, a parceria é uma troca entre as empresas e os presos. “Minha empresa está formando profissionais, damos treinamento e a oportunidade. A gente usa a mão de obra em troca da ressocialização deles [detentos]. Ganhamos espaços para trabalhar, cedidos pelo governo, e oferecemos os empregos”, explica o empreendedor.

Também funcionam, no chamado espaço aberto – onde apenas os presos com bom comportamento podem transitar –, empresas de confecção de blocos de cimento para a construção civil, e de esquadria de alumínio. Formado em mecânica pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Gessé da Silva tem 29 anos e trabalha na penitenciária. Segundo ele, a nova chance não vai ser desperdiçada. “Faço portas, janelas, emborracho, faço todo tipo de esquadrias. Isso me ajuda a ressocializar. Desta forma, estou podendo mostrar a minha mudança para minha família e para a sociedade lá fora. Hoje sou outra pessoa e, quando sair daqui, vou levar uma vida diferente da que eu tinha. Meu foco agora será no trabalho”.

O apoio à reviravolta na vida dos detentos é endossado pelo encarregado de produção da empresa de esquadria de alumínio, Antônio Marcos Santos. Segundo ele, muitos dos presos que vivem enclausurados nas penitenciárias só precisam de uma chance para mudar. “Eles fazem um bom trabalho, mas é preciso que tenham oportunidade. Por exemplo, um rapaz que passou para o regime semiaberto, demonstrou talento e ainda está trabalhando conosco na empresa. Aqui é possível encontrar excelentes profissionais e salvar muitas vidas aparentemente perdidas”, opina o trabalhador de 33 anos.

Atividades de lazer e esporte

Nas salas e nos pátios dos módulos penitenciários da PLB, são realizadas atividades de lazer e de esporte. Além disso, a arte é estimulada pelos grupos de assistentes sociais e psicólogos. Segundo a coordenadora de Atividades Laborativas e Educacionais da Penitenciária, Tânia Lúcia Santos, “é preciso estar no perfil de pena, ter comportamento adequado, receber visita familiar e aptidão. Cumprindo esses requisitos, o detento tem oportunidade de ir para o chamado espaço livre”. Tânia faz parte de uma equipe especializada no acompanhamento e na avaliação dos presos. Quem se enquadra nos requisitos, amplia o universo dentro da Lemos Brito.

As oportunidades de mudança não contemplam apenas os presos que podem transitar no ‘espaço livre’. Aos 32 anos, Eliton Carvalho descobriu um dom. Ele trabalha com madeira, é criador de peças como aviões de brinquedo, bancos, cadeiras, guarda-roupas, cômodas e estantes. Com o término da pena se aproximando, ele já tem planos para o futuro. “Só trabalhar agora. Montar meu negócio lá fora, junto com minha mãe. Vou ser dono de uma serraria quando sair daqui”.

O diretor da PLB, Everaldo Carvalho, acredita que com estímulo e prática de atividades sócioeducativas, o sistema penitenciário pode passar a funcionar como ferramenta fundamental na recuperação de vidas desacreditadas. “Primeiramente, a prisão tem a função de controle daqueles indivíduos que, por algum motivo, quebraram o contrato social e se tornaram uma ameaça à sociedade. Mas, uma vez que eles adentram a área prisional e vêm à penitenciária, temos o compromisso de trabalhar esses cidadãos para que possam voltar à sociedade com a cabeça erguida. Através da penitenciária, eles têm a chance de repensar a vida”.